quinta-feira, 12 de março de 2009

Coisas Que Perdemos Pelo Caminho


Quando paro para pensar um pouco sobre a vida em um contexto geral, consigo enxergar o poder que ela exerce sobre cada um de nós, seres humanos. Somos mamíferos diferenciados. Sentimos, zelamos, cuidamos de nossas "crias", mas, diferentemente da grande maioria dos outros animais da mesma classe, fazemos isso por toda a vida. Prefiro, nesse caso, generalizar a situação, esquecendo-me dos monstros sociais que criamos e abraçamos em nosso dia-a-dia; os pequenos Brutus que se vingam do descaso social, esfaqueando-nos sempre que possível, em uma "vendetta" futil e infinita, na tentativa de alimentar uma sede de sangue que é, na verdade, insaciável. Mas isso é assunto para outro dia. Hoje, quero falar com vocês sobre a vida.


A vida é algo subliminar, porém imprevisível. Pode nos adoçicar com o mais doce mel; como pode nos amargar com a pior das peçonhas. Pode ser insidiosa, mas fazer com que o mamífero vire inseto, incubando-se em um casúlo construído por ele mesmo, para dali a alguns dias transformar-se em uma linda borboleta, renovado em força e espírito; ou pode ser generosa, mas fazer com que o despreparado afunde-se em uma lama de tentações, transformando, assim, o mamífero em anfíbio. Alguns não a suportam e despedem-se prematuramente, outros a abraçam por mais de um século. Porém, algo é indiscutível: no momento em que nascemos, ela é igual para todos.


A verdade é que nossa vida é uma soma de experiências que individualizam o ser humano. Cada um é único, exclusivo, singular, com apenas uma realidade coletiva irrefutável: todos perdemos coisas pelo caminho. As experiências que vivemos por toda nossa trajetória, faz de nós, mamíferos, nada mais que répteis trocando de pele, seguindo em frente com a nova casca, enquanto abandonamos a velha para trás. Mudanças são sempre bem-vindas; renovam o espírito, trazem novas possibilidades, abrem portas diferentes; e, assim como o ar, acredito que todos nós precisamos nos renovar de tempos em tempos. Todavia, muitas vezes deixamos para trás coisas que não deveríamos.


Pergunto-me em diversas oportunidades, onde foi que deixei a inocência da minha infância? Não aquela inocência que poderia me fazer de idiota no mundo real, mas aquela que me trazia a segurança de que tudo sempre daria certo no final; que todos os meus problemas em algum momento se resolverão; que me fazia enfrentar as situações sem perder a alegria intrínseca de criança. Quando foi que perdi essa minha maneira de ser? Queria muito tê-la de volta, de coração.


Em que quilometro dessa trilha deixei, também, aquela ansiedade gostosa da adolescência? Aquele friozinho na barriga que surge quando estamos perto de dar o primeiro beijo naquela linda garota da festa; ou quando percebemos que a fila da montanha-russa já está se aproximando do brinquedo. Aliás, se pudesse definir qual a melhor versão de mundo na minha opinião, diria que seria um gigantesco parque de diversões. Quando vamos ao Parque de diversões, estamos sempre em família ou com amigos, felizes, bem humorados, despreocupados; cercados, entretanto, de regras visando nossa segurança e a de quem amamos, e que buscam um bom convívio entre todas as pessoas que dividem o local. Lá, adulto pode ser criança, sem ser irresponsável.


Também queria buscar aquela rebeldia de alguns anos atrás, quando era um jovem adulto, começando a ser cercado pelas responsabilidades que permeam nossas vidas. Rebeldia que me fazia questionar as coisas, procurar saídas, inventar soluções. Hoje sou mais um pragmático dentro de um sistema em que perguntas deixam de ser feitas por medo das respostas; ou das consequências. Vivo enclausurado por um acúmulo de experiências que me transformaram em borboleta, mas me impedem de voar. Tenho medo de ser livre. A vida me trouxe muita coisa boa, mas o preço tem sido salgado. Quero ser completo. Amo o que tenho e sou, mas quero resgatar o que perdi. A vida não é excludente. Ter um não significa perder o outro, como costumamos acreditar. Mas fato é que essa soma pode te libertar, e uma vez livre, quem consegue parar uma borboleta?


Entretanto, enquanto questionava esses princípios, levei uma nova rasteira da vida. Dessa vez, uma rasteira gostosa, na verdade, maravilhosa, mas que derrubou meus alicerces: João Gabriel. O nascimento do meu filho me mostrou que nossas experiências, nossas cascas, não ficam inteiramente pelo caminho, mas sim, adormecidas, hibernando em um profundo sono, silenciadas pelas novas camadas de pele que acumulamos durante os anos. Meu filho chegou, como uma mensagem da vida, dizendo-me que posso ser completo; que posso ser melhor. Para tanto, basta quebrar o casúlo que me envolve e voar, não para fora, mas para dentro; em uma jornada de auto-conhecimento que me tornará melhor homem, irmão, filho, amigo, mas, sobretudo, pai. Afinal, como disse no início desse texto, eu sou um mamífero, e, pra mim, é para toda vida.

Um comentário:

Altavolt disse...

Ragas, é impressionante como um filho nos faz compreender profundamente os nossos pais, além de nos reconectar com as nossas fases passadas e adormecidas. Filho é tudo de bom. Talvez nos ensinem mais do que nós a eles! abraço!